“Aifones”

Entrei na clínica médica para consulta e ali havia umas 12 pessoas no aguardo.

Todas com "aifone" e olhos vidrados no aparelho.

Dei “bom dia”, meio tímido e, de volta nenhuma palavra, apenas celulares apontados em minha direção com os "bons dias" em suas telas. Sentei e tentei puxar conversa com um senhor à minha esquerda, ele não respondeu com palavras, mas com uma digitação em seu "aifone":

Quer conversar? Se quiser me passa o número do seu zap.

Achei melhor obedecer e digitei no meu "aifone" o número do meu zap. Ele adicionou e começamos a conversar... ops... a digitar.

 Eu ali, de papo com o senhor, que descobri chamar-se Caio, quando senti uma pancada em meu pé, ao olhar vi que a moça sentada à minha direita, ao se levantar olhando para tela do "aifone" tropeçou em meu pé.

Ela olhou bem pra minha cara gravou um áudio e me cutucou, passando seu "aifone" para que eu pudesse escutar. O áudio, de dois segundos, dizia:

Desculpa!

Eu, inocente, falei pra ela: "Magina... não tem problema"...

Quando todos ouviram minha voz, olharam-me com reprovação e escreveram em seus respectivos "aifones" mostrando-me a tela: - Silêncio!

Entendi o recado e digitei: Ok!

E assim passou o tempo até chegar o momento do médico me atender. A recepcionista, como já tinha meu número de zap, enviou uma mensagem pedindo para eu entrar. Entrei na sala do médico. 

Cumprimentei-o com um "bom dia".

O doutor digitou em seu "aifone" um "bom dia" como resposta.
Disse pra ele: Tudo bem, doutor, eu já entendi.

Ele digitou e me mostrou o que havia escrito em seu “aifone”:
Entendeu nada, se tivesse entendido teria digitado ou gravado áudio. Aliás, que mundo você vive? 

Fiquei ali, meio sem graça depois do sabão do médico, então, digitei:

Vamos à consulta? Foi aí que o médico começou o exame gravando um áudio em seu "aifone". 

Gravava o áudio e me enviava. Eu ouvia e respondia pra ele com outro áudio.

E assim fizemos por 20 minutos até ele encerrar a consulta e digitar que mandaria a receita dos remédios pelo zap.

Agradeci, em áudio, e sai do consultório satisfeito, pensando:

Bons tempos em que vivemos, temos hoje um intermediário para os papos, os "aifones" sempre prestativos e atenciosos a conectar-nos ao mundo e as pessoas.

Sinais da evolução!

Será?

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